segunda-feira, 12 de abril de 2010

Ser designer - parte II

Vou começar citando a Marina, porque ela escreveu uma coisa que venho sentindo desde que voltei pro mundo blog, e espelho completamente seus sentimentos:

"Hoje eu li o blog da minha irmã e resolvi deixar um comentário. É meio engraçado como mesmo que não nos encontremos ou conversemos tanto assim sinto que nós duas estamos sempre em sincronia. Vivemos coisas diferentes, tomamos decisões diferentes, mas eu quase sempre me identifico muito com o que ela pensa. É meio difícil isso de estar tão próxima de alguém que tem uma vida diferente. Acho que é difícil não querer às vezes estar na pele dela. É claro que sinto esse tipo de coisa em relação a todas as pessoas que admiro, mas é mais freqüente neste caso."

E vou continuar comentando no que ela disse no blog dela. Isso é pra Mali, para meus amigos designers ou arquitetos, para minha família, ou qualquer um que se interesse.

Sou péssima em projeto.

Sou mesmo. Eu me acho inteligente, tudo bem, e acho que consigo enxergar as coisas de pontos de vistas variados, gosto muito de pensar nos processos e nas pessoas, acabo fazendo projetos porque preciso (no escritório ou na vida). But I suck at it. Sou boa analista, consigo chegar em um programa razoável, consigo enxergar consistência ou não, posso pensar em dez formas diferentes de resolver um problema - mas não consigo sair de uma folha em branco sem me forçar às lágrimas. Quando começo, preciso criar umas 15 opções que são tudo - feias, desajeitadas, molengas, inadequadas, completamente erradas, sem graça, sem vida, parece a mesa de centro da bisavó, ou então é amalucado sem razão de ser, inconsistente. Preciso desenhar sem pensar (e aliás não desenho bem), e preciso olhar para os desenhos sem avaliar muito - ou acabo desistindo. Até chegar em uma solução que eu não deteste.

Projeto é uma tortura infinita.

Depois, com avaliação do orientador (teve um que chegou a rabiscar coisas no meu desenho), fica mais fácil, pois entro na parte que eu consigo fazer - avaliar, pesar critérios, modificar, melhorar. E mesmo assim, cada vez que isso significa uma reestruturação do desenho, é penoso. Nunca tão penoso quanto o começo, mas ainda assim horrível.

Só consegui levar a FAU porque a maioria dos trabalhos era em grupo, ou ao menos duplas. Com feedback, com outras pessoas para dar pitaco e rabiscar junto, tudo fica infinitamente mais fácil. Ou seja, fica até factível. Mas, como eu disse no sábado, prefiro não projetar. Prefiro usar o que eu sei fazer, e aquilo no qual me considero até boa - coordenar, pegar as idéias boas e organizar, resolver problemas, trabalhar com gente, não com o projeto em si.

Vou dizer que era frustrante ver os outros alunos com desenhos razoáveis em algumas horas, e eu conseguindo definir uma planta que prestava depois de semanas. Muitas vezes pensei em desistir. Só não desisti porque tinha o Alex, as pessoas, e eu ainda acho projeto uma coisa linda. Mas tudo bem - eu sempre soube que arquitetura seria difícil - sempre. Escolhi o curso porque era algo em que eu teria dificuldade - e muitas vezes me arrependi. Fugir do seu talento nem sempre é a melhor idéia, nem para você, nem para o mundo.

Não que eu não tenha me encontrado lá, de certa forma. Mesmo dentro do paisagismo - cujo desenho é uma derivação quase direta do programa - o que facilita muito. Só espero conseguir cantar na minha própria nota. Não busco mais nada. (como se fosse pouco...)

4 comentários:

Mayra Mello disse...

Frase do dia: Projeto é uma tortura infinita.
Já te falei que arquiteto é masoquista né? No Brasil então, chega quase a ser caso de internação!

Mariana Wilderom disse...

Não pude deixar de comentar porque já me perguntei e já pensei muito sobre isso. Em parte, fui achar no projeto de móveis o jeito de projetar arquitetura e vice-versa. Depois de um parto que foi meu tfg - acabou sendo realmente um rito de passagem - as coisas finalmente entraram no seu lugar. Pela primeira vez fiz algo de cabo a rabo e acho que finalmente entendi porque Paulo Mendes da Rocha é lindo. Já tinha entendido isso, mas não DESSE JEITO. O grande problema é que vinculam o ato de projetar a genialidade, ou criatividade ou coisa assim. E - na minha modesta opinião - não é. A genialidade pode ser a cereja do bolo, mas não é ela que te faz um bom projetista. Arquitetura é hierarquizar prioridades. Não adianta sair desenhando antes de fazê-lo muito rigorosamente. Se você tem mil ideías boas, elas todas juntas não darão um bom projeto. Só quando colocá-las em seu devido lugar, com seu devido peso (uma abaixo da outra) é que vai surgir uma diretriz de projeto. Se não, quando voce vê, está subordinando o módulo estrutural ao vão do caixilho (nãaaaao... a estrutura é o projeto mais caro, mais complexo, definidor da ordem de grandeza da obra, do partido arquitetonico... sabe?)... quantas vezes já nao fiz isso... Antes então, tem a hierarquia das funções. O que é definidor? Circulação? Salas de aula? Espaço público? QUal é o tom principal do projeto? Com minhas palavras, queria desmistificar o ato de projetar. Faço das palavras da Lina, as minhas

" “Os homens médios não sabem construir. A pseudo-cultura, o desejo de sobrepujar e o dinheiro desfiguram o intento da arquitetura. A casa não reflete mais a vida, mas sim, um conjunto de preconceitos, de aparências e convenções; a arquitetura burguesa torna-se assim a direta responsável pela insuficiência do homem contemporâneo.
Ali está a nossa casa. Simples, sem voltas, sem retórica. Uma casa em que os espaços foram cuidadosamente examinados, calibrados, pensados, não sobre a base da especulação da construção, mas sobre a base da solidariedade humana; uma casa onde é possível viver, e principalmente pensar, onde há espaço para tudo, um espaço cuidadosamente dosado, que vai da cozinha dada com um laboratório químico, ao esconderijo para os barbantes e rolhas usadas.Senhores construtores, quando entendereis que experimentamos uma necessidade intensa de poesia, quando acabareis de nos dar a pílula dos frontõezinhos e das balaustradas para fazermos engolir a insuficiência moral das contruçõs baseadas sobre a renda e o emprego? No fundo, aquilo que o homem do povo faz é malcriação. É malcriação com aquilo que os arquitetos de hoje fazem .Esta é uma anotação sobre a aristocracia rural-popular brasileira enxotada pelas monoculturas. Não é saudade, a história não volta e não é Mestra. É um adeus e, a um tempo, o convite à documentação da história do Brasil. Um convite para os jovens considerarem o problema da simplificação (não da indigência) no mudo de hoje; caminho necessário para encontrar dentro do humanismo técnico, uma poética.”

De tudo que botei ai da Lina, o mais importante é isso " dentro do humanismo técnico, uma poética" e não o caminho contrário.
Se você constroi todas as variáveis matemáticas, os limites, as necessidades de programa, vai ver que sobra um pouquinho pra poética. Desculpa, me empolguei. Só queria dizer que acho sim, que tem uma baita designer, arquiteta dentro de você. Você só ainda não descobriu seu modus operandi. Espero ansiosamente pra ver uma demonstração desse poder, quando ele for alinhado e, assim, otimizado ao extremo!

beijocas,
mari (o maior comentário ever)
(dificil insistir nisso quando a verificação de palavra é "tonto". parece até que o blogger tá me tirando...rsss)

Mariana Wilderom disse...

só mais uma coisa.
O troço todo da Lina (to escrevendo um artigo que passa por ela, o que justifica a empolgação) que eu coloquei é chover no molhado em muitas coisas. Não quis dar enfase nessa coisa toda de frontoes dispensaveis e coisa e tal (é mto bom o texto, mas foge do que dicutíamos). O que importa pro que eu disse é a poética dentro do humanismo técnico, sabe?
Arquitetura é quase matemática. Mas cada um resolve a equação de um jeito. Dai sai a poesia. Mas primeiro tem que resolver a equação.

beijoca

Talita Salles disse...

Mariws, só vou dizer - obrigada. Muito bom ter você acompanhando a minha vidinha, quando está numa hora do cafézinho da sua. Volte quando quiser!